Mas foram essas dezenas de milhar de emigrantes, com as suas volumosas remessas de dinheiro, que permitiram, a Salazar, equilibrar os orçamentos de Estado.

Salazar, prossegue imperturbável a sua tarefa. O comércio e a indústria desenvolvem-se. A marinha atinge o apogeu.

Salazar não gostava de ser contrariado sobre interesses que ele considerava fundamentais para o bem de Portugal. Isso não o deixou ver que hoje o mundo evolui a um ritmo alucinante e que há cedências que são essenciais para a própria defesa e crescimento do País.

Também é verdade que Salazar, ao proteger Portugal da Segunda Guerra Mundial, lhe travou o desenvolvimento futuro. Enquanto os países que foram totalmente devastados pelas guerras foram obrigados a construir e a modernizar escolas, hospitais, casas, ruas, estradas, monumentos, fábricas. A fazer tudo de novo, limpo e com as técnicas mais avançadas do mundo, vindas e pagas pelos Estados Unidos através do Plano Marshall e coordenadas pela Organização Europeia de Cooperação Económica. Em Portugal, como não tinha havido guerra, continuou tudo como dantes. A própria Espanha foi sangrada na Guerra Cívil. Quando a visitei, pela primeira vez em 1945, fiquei horrorizado. Mulheres, todas vestidas de preto, homens, mulheres e crianças de alpargatas, carros seguros por arames, casas destruídas, bairros degradados, pontes a cair de podres. Os espanhóis aceitaram os sacrifícios porque o sofrimento e o horror tinham sido dantescos. Sofreram as dificuldades com muita dignidade. Isso deu a Espanha próspera e feliz dos nossos dias. A França ainda em 1957 lambia as feridas. A abertura de valas para canalizações e fios ainda era feita a pá e picareta. O operário tinha uma meta diária: 10 metros de comprimento por um de fundo. Os nossos emigrantes chegavam a fazer 34 metros. Os outros, a maior parte deles, não conseguia chegar aos 10. O português é rijo, inteligente e ambicioso, quando quer. Na Alemanha continuava a reconstrução. Todos trabalhavam um mínimo de 12 horas, sete dias por semana. Até a bisnaga da pasta de dentes era guardada para ser reciclada. Todos cumpriam sem um queixume. O Reino Unido recuperou mais rápido, mas mesmo assim com muito esforço e muita renúncia.

Em Setembro de 1968, Salazar, sofre um acidente caseiro de que nunca mais recuperou.

Muitos intelectuais descontentes com Salazar exilaram-se, como foi o caso de Jaime Cortesão, Adolfo Casais Monteiro, Henrique Galvão, Jorge de Sena, ou José Rodrigues Miguéis. Outros, como Aquilino Ribeiro, António Sérgio, Almada Negreiros, Alves Redol, Soeiro Pereira Gomes, Bento de Jesus Caraça, José Gomes Ferreira, Lopes Graça ou Bernardo Santareno, arriscavam edições para a PIDE procurar nas livrarias quando havia muito alarido à volta da obra publicada. Outros ainda, como Ferreira de Castro, Raul Proença, Augusto Casimiro, Afonso Duarte, António Patrício, Jaime Batalha Reis, Teixeira de Pascoaes, Tomás da Fonseca, Mário Dionísio, Alexandre O'Neill, José Régio, João Gaspar Simões, Eugénio de Castro, Maria Lamas, Fernanda de Castro, Fernando Namora, David Mourão Ferreira, Miguel Torga, Vitorino Nemésio, Vergílio Ferreira ou Natália Correia escreviam sem se importar com as consequências. Presos ou livres, com Salazar ou sem Salazar, é-lhes indiferente.

Os políticos são pó, a Literatura é eterna e o pensamento, mesmo preso, anda por onde quer.

PRIMAVERA MARCELISTA

ESTADO SOCIAL

Para substituir o Dr. Oliveira Salazar, o Presidente da República escolheu o Professor Doutor Marcello Caetano. Era Professor de Direito, reitor da Universidade de Lisboa, considerado um democrata e um homem de inteligência e honestidade invulgares.

Imediatamente acaba com a polícia política, a PIDE. Mais tarde substituída pela DGS, para defesa do Estado.

Abre-se a esperança para a oposição. Agora, com Marcello Caetano, liberal, avesso a violências e pacificador, que abria a porta e os braços aos exilados, tudo parecia ir correr bem. Mas ainda em 1968 é preso o padre Felicidade Alves, pároco de Belém e em 1970 o padre Mário de Oliveira da Lixa, por contestarem a política Ultramarina. Neste ano, morre Salazar.

A Primavera Marcelista, como ficaram conhecidos os primeiros anos do Professor Marcello Caetano, saldou-se pelo progresso, uma melhoria social com a atribuição de pensões aos trabalhadores rurais e às profissões mais modestas.

Através das "Conversas em Família" na RTP, o Prof. Marcello Caetano, explicava ao país as medidas que o Governo tomava e tudo parecia sossegado.

Os planos quinquenais de fomento continuaram. O desenvolvimento do país era uma realidade. Mas havia necessidade de uma abertura política que permitisse a formação de partidos políticos. Marcello Caetano sabia-o e tentou tudo para o conseguir.

Em 15 de Maio de 1972, o jornal de "Economia e Finanças" advoga a não entrada na CEE, em virtude de, ao fazê-lo, sermos obrigados a abandonar o Ultramar. A 12 de Outubro é morto pela DGS o estudante José António Ribeiro dos Santos. A 30 de Dezembro, um grupo de católicos ocupa a capela do Rato e aprova uma moção contra a guerra colonial. A DGS invade o templo; muitos são presos e o padre Alberto Neto, responsável pela capela, é exonerado das suas funções.

O período de graça esfuma-se.

Marcello pede a exoneração do cargo ao Presidente da República, este não aceita.

A 13 de Julho de 1973, Marcelo Caetano autoriza os oficiais milicianos a passar aos quadros permanentes. Os oficiais de carreira não gostam do Decreto. Deste descontentamento, motivado pela progressão nas carreiras e seus respectivos vencimentos, irá nascer o 25 de Abril.

A 23 de Fevereiro de 1974 o general Spinola publica o livro "Portugal e o Futuro" onde advoga a adesão à CEE, o fim da guerra do Ultramar e a constituição de uma federação de Estados.

Os militares sentem-se apoiados.

A 16 de Março de 1974 dá-se um levantamento militar que partiu das Caldas da Rainha, mas que abortou.

A 1 de Abril de 1974, O Prof. Marcelo Caetano assiste, em Alvalade, ao jogo Sporting - Benfica. A multidão ovaciona-o efusivamente. Ele, que já tinha pedido, de novo, a exoneração do cargo, alegando razões de saúde, fica emocionado.

A 17 de Abril, o ministro do Ultramar, Dr. Rebelo de Sousa, faz sair uma portaria que tornava extensiva, a Lei Nº 5/73 (reforma do sistema educativo) às províncias de além-mar.

A 25 de Abril de 1974, o Regimento de Santarém, comandado por Salgueiro Maia, avança sobre Lisboa, Marcelo Caetano é informado sobre o que está a acontecer, não tem coragem de o impedir. Pensou que assim seria mais fácil resolver o problema do Ultramar e fazer reformas urgentes com a anuência de diferentes partidos políticos tendo como padrão uma democracia de tipo ocidental. Julga poder continuar no país. Spínola pede-lhe que siga para a Madeira com o Presidente Américo Thomás. Este acusa-o de não ter querido evitar o que aconteceu. Cortam relações. No Funchal compreendeu que as condições não lhe permitiam continuar a colocar a sua inteligência ao serviço da Pátria. Morreu no Rio de Janeiro, amargurado e revoltado com a cegueira e a ingratidão dos homens.

Em carta que me dirigiu, datada de 2.XI.78, vinda do Rio de Janeiro e publicada em 1993 no livro "Crónicas da Província e Intervenções Parlamentares" pags, 14 e 15. Edição de "A Província", e hoje em www.cunhasimoes.net ao responder à minha pergunta: por que aceitou ser Primeiro Ministro e lá continuar, a certa altura diz: "...foi isso que me permitiu aguentar cinco anos e meio o regime e fazer um esforço para salvar o que fosse possível, no meio da cegueira dos políticos, da recusa de colaboração dos adversários ou dos reticentes, do egoísmo dos capitalistas, da estupidez da alta burguesia, das ilusões dos intelectuais irresponsáveis, da manobra da Igreja preocupada em não perder algum comboio vindouro e a braços com o problema ultramarino que no país a direita se recusava a compreender da única forma possível e que a ONU não deixava resolver pela única maneira que seria admissível para Portugal..."

Vê-se, por este pequeno extracto, quanto se sentia amargurado, frustrado e desiludido com a incompreensão dos homens. Não quis regressar à Pátria. Repousa em terras Brasileiras. Viver e morrer no Brasil é tão apaixonante como viver e morrer em Portugal. A língua abraça-nos e encata-nos. A eternidade aceita-se com menos esforço.

A TERCEIRA REPÚBLICA

Forma-se uma Junta de Salvação Nacional, em substituição do Governo deposto, composta pelos generais do exército; António Spínola e Costa Gomes. Generais da Força Aérea; Galvão de Melo e Diogo Neto. Comandantes da Marinha; Rosa Coutinho e Pinheiro de Azevedo.. Mas o Movimento das Forças Armadas (MFA), formado pelos Capitães de Abril, pretende ser ele a ratificar decisões.

À euforia do 25 de Abril, seguiu-se, pouco tempo depois um clima de receio e desconfiança. Formaram-se rapidamente vários partidos. De todos, o melhor organizado era o comunista, que saía da clandestinidade e tinha os seus próprios quadros. O socialista tinha muitos contactos e apoios internacionais.

O general Spínola foi designado Presidente da República a 16 de Maio de 1974.

O 1º Governo Provisório, presidido pelo Dr. Adelino da Palma Carlos, tenta um equilíbrio de forças. No Governo ficam os representantes dos três principais Partidos: Mário Soares pelo Partido Socialista; Sá Carneiro pelo Partido Popular Democrático e Álvaro Cunhal pelo Partido Comunista Português.

A maior dificuldade estava em resolver o problema do Ultramar. A Junta de Salvação Nacional e os generais Spínola e Costa Gomes eram a favor de uma tese federalista, tornando os Estados autónomos mas interdependentes, pelo menos durante alguns anos, até formar quadros capazes de dirigir os países sem sobressaltos.

À frente do Ministério da Coordenação Interterritorial está o Dr. Almeida Santos que tenta tudo para que os territórios Ultramarinos tenham uma transição calma de modo a preservar a qualidade de vida dos povos. Em 21 de Maio de 1975 vai a Moçambique. Em Lourenço Marques (Maputo), declara que a independência será uma das opções a realizar dentro de um

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